Ainda de ressaca sentimental e alcoólica, Lucila estava calada. Não participava da festa que seus amigos faziam na casa. Claro, que todos perceberam, mas associaram ao mal-estar causado pela bebida.
Lucila maquinava várias coisas e mentalmente fazia uma lista de assuntos que gostaria de resolver logo do início do ano. Bruna era um destes assuntos. Lucila se sentia usada pela amiga. Uma mistura de raiva e preocupação tomava conta dela cada vez que pensava no assunto. Tudo que Lucila fez e ela não teve nenhuma consideração. Chegou até a retomar o contato com Rafa, um perigo para sua vida. E nada disso Bruna reconhecia. Simplesmente sumiu sem dar a mínima pra ela.
No meio dos seus pensamentos Ana ligou. Estava radiante com sua última prova de vestido. “Felicidade absoluta”- pensou Lucila. Era muito bom ouvir uma voz tão empolgada de uma noivinha transbordando boas energias. Ana contou tudo sobre as últimas decisões do casamento. Contou sobre a reforma do apartamento, sobre a lua de mel. Lucila se deliciou em ouvir. Ana casaria logo e Lucila acompanhava cada passo. Aliás, Lucila e Bruna, mas agora as duas não sabiam de Bruna.
Como se as duas pensassem ao mesmo tempo em Bruna, fez-se um silêncio. Logo depois Ana falou:
- Lú, o que houve com nossa amiga? Eu não posso acreditar que a Bruninha sumiu desta maneira sem se preocupar com a gente. Isso não faz sentido. Ela sempre foi a mais ajuizada de nós. Tenho certeza que alguma coisa muito séria está acontecendo.
Lucila respirou fundo concordando com a amiga, que continuou a falar:
- Desculpe a aminha ausência nesse assunto. Sei que estou sendo egoísta só falando de festa, casamento, vestido. Eu confesso que em um primeiro momento só me preocupei com o vazio no altar. Afinal, Bruna e Juca são ou eram meus padrinhos. Depois cai na real e percebi que ela jamais faria isso comigo. E eu nem pra te ajudar. Imagino como deve estar sendo difícil pra você lidar com isso. E lidar com Rafa. Como eu posso te ajudar?
Ah! Como era bom ter uma amiga como Ana. Não era preciso falar nada. Ela sabia. Conhecia Lucila como ninguém. Normalmente rebateria a afirmação. Sempre gostava de se mostrar forte, dona de si. Mas desta vez nem pensou em negar. Com frio na barriga, desabafou:
- Ai Aninha, não me lembro de um fim de ano tão complicado e confuso pra mim. Tudo que estava em seu lugar parece ter saído. Não sei o que fazer com Bruna, como ajudar. Não sei nem por onde começar. – outro suspiro, uma limpada na garganta. – O Rafa me mandou flores antes de viajar pra Bahia. Voltei a lembrar de nós dois. Sempre achei que este era um assunto encerrado na minha vida. Mas não é. Sei que tenho que me afastar, mas não sei como.
- Lucila, vocês tiveram uma história enorme juntos. É natural que você ainda se abale. Mas precisa pensar e ser racional nesta hora. Vamos nos concentrar na Bruna. Isso ajuda a não pensar em besteira e ajuda a resolver este problema.
- Ok. Você tem razão. Mas por onde começamos? Tudo que sabemos é que ela está grávida e anda por aí com um tal de Marcelo Zacaro, sócio-diretor da JAEH.Nesse momento Lucila se lembrou de Manú na casa ao lado. Contou a amiga do papel ridículo fez ao se esconder da garota. Mas Manú não ajudaria a encontrar Bruna. Elas nunca se deram bem e não seria agora que Bruna havia descoberto as sujeiras da JAEH que iria se aproximar da cúmplice do seu marido. As duas falavam sem parar até que Ana falou mais alto:
- Lú, a única pista que temos é esse Marcelo. Podemos tentar descobrir onde ele mora. Eu posso, eu estou no Rio. Vou procurar na lista telefônica ou posso descobrir por uma secretária na JAEH. Eu vou lá! Deixa comigo!
- Mas é véspera de réveillon?
- E daí? Você acha que Bruna está pensando nisso? Ela nem deve se lembrar que o ano está acabando. Vou atrás disso! Eu te ligo! Beijo!
Antes que Lucila pudesse dizer alguma coisa, Ana desligou. Lucila ficou pensando que sorte tinha em ter Ana por perto. Todo esse tempo tentou não a envolver em nenhum dos seus problemas, pois acreditava que Ana precisava viver com plenitude esse momento “noiva”. Mas Lucila precisava mesmo de uma mão amiga. E agora sentia-se mais leve e disposta.
A essa altura todas as tribos da casa já tinham seus integrantes. A ala arco-íris era composta por Flávio, Tadeu e Marcos. A ala heterossexual tinha além de Lucila e Carla, os dois primos de Carla e dois amigos. Lucila até se interessou por um deles, desconsiderando completamente o fato do rapaz ter apenas 22 anos.
Além disso, havia duas meninas que foram parar na casa nem se sabe como. Talvez amigas do amigo do amigo. Mas a casa era grande e comportava todo mundo muito bem.
Em sua primeira noite, a casa parecia mais o primeiro episódio de um reality show. Claro, desconsiderando os móveis velhos, a pintura descascada e as infiltrações disfarçadas por lenços, lençóis e muita criatividade. O clima era de muita empolgação. Todos se cumprimentavam, contavam suas histórias, suas origens e tentavam agradar. O som estava alto e outras pessoas começaram a chegar. Eram amigos e conhecidos que estavam hospedados por perto que também iriam pra festa na noite de réveillon. Parecia um pré-réveillon. Alguns vizinhos do condomínio também apareceram, convidados pelos primos de Carla.
Lucila não reparou quando Manú entrou na casa acompanhada de duas amigas.
Entre uma cerveja e outra Lucila flertava com seu rapazinho de vinte e dois aninhos. Jogadas de cabelo, risadinhas, piscadinhas. Puro charme. Lucila precisava relaxar e nada melhor do que se sentir desejada para levantar a moral. Ele pegou na sua mão e a puxou em direção à varanda. Chegando lá, um carinho aqui, outro ali. De repente alguém a cutucou.
- Essa é uma situação bem mais interessante para nos encontrarmos do que aquele barraco que sua amiguinha fez com meu chefe, não acha? – disse Manú sarcasticamente e fazendo questão de reparar na pouca idade do amigo de Lucila. Sorrindo ela continuou:
- É! Você sabe como se divertir Lucila. Pena que sua amiga não saiba.
Lucila deu um pulo, se afastando do rapaz e indo em direção a Manú:
- O que você quer dizer com isso?? O que você tem a ver com o sumiço de Bruna? – Segurando o braço de Manú, repetiu: - Cadê minha amiga? O que vocês tem a ver com isso? – a essas alturas o rapazinho já tinha saído de fininho, deixando as duas sozinhas. Manú em um solavanco se soltou e gritou:
- Você está louca? Não admito que encoste em mim. Você é desequilibrada igual a Bruna! Empurrando Lucila, ela saiu da casa.
Lucila ligou correndo para Ana e contou tudo que havia acontecido. As duas que já não gostavam de Manú, agora tinham verdadeira ojeriza. Ana estava decidida em ir atrás do Marcelo. Ela achava que Bruna só poderia estar com ele.
As duas ficaram de se falar nos próximos acontecimentos.
A casa já estava ficando vazia e com cara de fim de festa. Lucila não pensou duas vezes, foi se deitar. Queria estar bem disposta no dia seguinte, o último dia do ano. Mais do que nunca Lucila acreditava no milagre da mudança de ano para acalmar sua vida.
quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009
terça-feira, 17 de fevereiro de 2009
CAPÍTULO 14
O porre foi enorme. Aliás, não tinha como ser diferente porque elas nem chegaram a almoçar. Estômago vazio e cerveja é um prato cheio pra bebum.
As duas gargalhavam, falavam alto. Fizeram amizade com o garçom e esqueceram completamente do mausoléu que as esperava pro feriado.
Entre um copo e outro Lucila achou que já estava vendo coisas. Ela jurava que tinha visto Manú, a assistente do Juca, passar de carro pela rua. Isso a fez lembrar-se de Bruna e lhe trouxe alguma preocupação, que aliada a várias cervejas a fez cair no choro.
Neste instante Flávio, Tadeu e Marcos chegaram. Carla já tinha avisado das condições da casa e que as duas estariam na esquina, afogando as mágoas.
Lucila soluçava e repetia sem parar:
- Minha amiga exxxtá.... está....grávida! Sabia? Grávida! E eu não sei onde ela exxxtá...está!
Sem muito alvoroço, os meninos colocaram Lucila no banco traseiro do carro e os cinco seguiram pra casa mal abandonada, ou melhor: bem abandonada.
Tinham muito trabalho pra fazer por ali. Pra entrar, já seria preciso uma bela faxina. Marcos foi até o mercado e trouxe litros de desinfetante e algumas vassouras. O mutirão havia começado e só Lucila tinha se livrado desta. Estava inconsciente no sofá. Como todos eram arquitetos, com criatividade e alguns lençóis velhos conseguiram dar alguma dignidade àquele lugar.
O que antes seria uma janela quebrada virou um simpático tampo para uma mesa de centro. Colocaram cadeiras de praia em círculos na varanda e uma toalha de mesa cobrindo uma balde, que se transformou em uma mesa de canto.
Fora isso, fizeram faxina nos banheiros, esvaziaram a piscina e tentaram insistentemente falar com o maldito corretor de imóveis, que é claro, manteve seu telefone desligado.
Quando acordou, além de uma enorme dor de cabeça, Lucila se surpreendeu com o que viu.
- Vocês realmente são talentosos, hein? Acho que vou contratar vocês! – Rindo foi até o jardim olhar o restante da casa. Reparou que a casa ao lado estava vazia, mas que havia gente na seguinte. Um FoxCross preto estacionando na entrada denunciava moradores.
- Fox Preto? – pensou em voz alta.Sabia que tinha tido uma experiência com esse carro. Algo, uma lembrança, o que era? E de repente gritou:
- Manú! Eu vi a Manú!
Certamente sua voz saiu mais alto do que esperado, pois imediatamente alguém se levantou de uma rede e olhou como se respondesse ao chamado.
Era Manú! A própria! E agora era sua vizinha de condomínio em Angra. E pelo amassado do seu rosto, era provável que estivesse dormindo quando ouviu alguém chamar seu nome. Ela se levantou apertou os olhos em direção a Lucila.
- Quem é? Está contra-luz, não consigo enxergar.
Lucila não pensou duas vezes: entrou correndo na casa e ficou a espreita, que nem uma criança quando faz arte. Se sentou na beira de um sofá coberto por lençóis esperando que ela desistisse de descobrir quem a chamara. Mas isso era ridículo. E Lucila sabia. Cedo ou tarde as duas se encontrariam e é claro Manú saberia que foi Lucila quem a chamou. Lucila respirou e saiu novamente da casa.
Manú não estava mais em seu jardim. Lucila ainda andou um pouco em direção a casa vizinha, mas não viu ninguém.
Sua cabeça voltou a doer e agora sentia uma fome anormal. Felizmente da cozinha vinha um cheiro convidativo. Flávio acabava de fazer um espaguete que foi devorado pelos cinco.
Lucila não contou nada sobre Manú, pois teria que explicar sobre as trapaças de Juca e Bruna havia lhe pedido segredo. Apesar da amiga fujona não merecer, Lucila se sentia responsável por isso. Ela e Rafa eram donos deste segredo.
Na mesa, enquanto todos comiam, Flávio perguntou:
- Que diabos que você tava falando em bebunzinha? Que amiga que ta grávida? Você ta grávida? O que é que você ficava repetindo???
Lucila engoliu o macarrão e sacudiu a cabeça dando a entender que não sabia do que Flávio estava falando. Por dentro estava apavorada, com medo de ter contado mais alguma coisa. Sentia-se cansada com essa história e ainda Manú na casa ao lado. Precisava de um apoio. Precisava muito de Rafa. Ele saberia como lidar com isso. Com certeza se Manú soubesse algo sobre o paradeiro de Bruna, ele saberia como arrancar esta informação. Mas Rafa estava na Bahia e certamente nem se lembrava dessa história, ou mesmo dela.
Lucila se sentiu deprimida. E ficou ainda mais triste por enxergar um velho e conhecido sentimento. Ela sabia, mas não queria acreditar que novamente estava envolvida por Rafa. Ela não esperava mais mudanças e sabia que ela e Rafa não dariam certo. Teve raiva em pensar porque isso estava acontecendo. Porque ela não podia sentir isso por outra pessoa? Alguém em quem pudesse realmente ter uma relação segura, séria. Será que nunca iria se livrar deste fantasma? Será que ele era tudo que a vida tinha pra ela? Um homem lindo, divertido, simpático e completamente cafajeste? Lucila merecia mais do que isso, e sabia disso. A razão e a emoção se debatiam dentro dela. O medo de que nada melhor aparecesse e de que Rafa fosse realmente sua única opção. Eram anos tentando fazer funcionar esse relacionamento. E a cada volta era pior. Mais ciúmes de Lucila, mais mentiras de Rafa. Não havia tranqüilidade. Não era isso que ela queria, mas seu coração ainda o tinha lá dentro. Só estava adormecido, o sentimento sempre esteve lá e agora acordou. Lucila chorou.
As duas gargalhavam, falavam alto. Fizeram amizade com o garçom e esqueceram completamente do mausoléu que as esperava pro feriado.
Entre um copo e outro Lucila achou que já estava vendo coisas. Ela jurava que tinha visto Manú, a assistente do Juca, passar de carro pela rua. Isso a fez lembrar-se de Bruna e lhe trouxe alguma preocupação, que aliada a várias cervejas a fez cair no choro.
Neste instante Flávio, Tadeu e Marcos chegaram. Carla já tinha avisado das condições da casa e que as duas estariam na esquina, afogando as mágoas.
Lucila soluçava e repetia sem parar:
- Minha amiga exxxtá.... está....grávida! Sabia? Grávida! E eu não sei onde ela exxxtá...está!
Sem muito alvoroço, os meninos colocaram Lucila no banco traseiro do carro e os cinco seguiram pra casa mal abandonada, ou melhor: bem abandonada.
Tinham muito trabalho pra fazer por ali. Pra entrar, já seria preciso uma bela faxina. Marcos foi até o mercado e trouxe litros de desinfetante e algumas vassouras. O mutirão havia começado e só Lucila tinha se livrado desta. Estava inconsciente no sofá. Como todos eram arquitetos, com criatividade e alguns lençóis velhos conseguiram dar alguma dignidade àquele lugar.
O que antes seria uma janela quebrada virou um simpático tampo para uma mesa de centro. Colocaram cadeiras de praia em círculos na varanda e uma toalha de mesa cobrindo uma balde, que se transformou em uma mesa de canto.
Fora isso, fizeram faxina nos banheiros, esvaziaram a piscina e tentaram insistentemente falar com o maldito corretor de imóveis, que é claro, manteve seu telefone desligado.
Quando acordou, além de uma enorme dor de cabeça, Lucila se surpreendeu com o que viu.
- Vocês realmente são talentosos, hein? Acho que vou contratar vocês! – Rindo foi até o jardim olhar o restante da casa. Reparou que a casa ao lado estava vazia, mas que havia gente na seguinte. Um FoxCross preto estacionando na entrada denunciava moradores.
- Fox Preto? – pensou em voz alta.Sabia que tinha tido uma experiência com esse carro. Algo, uma lembrança, o que era? E de repente gritou:
- Manú! Eu vi a Manú!
Certamente sua voz saiu mais alto do que esperado, pois imediatamente alguém se levantou de uma rede e olhou como se respondesse ao chamado.
Era Manú! A própria! E agora era sua vizinha de condomínio em Angra. E pelo amassado do seu rosto, era provável que estivesse dormindo quando ouviu alguém chamar seu nome. Ela se levantou apertou os olhos em direção a Lucila.
- Quem é? Está contra-luz, não consigo enxergar.
Lucila não pensou duas vezes: entrou correndo na casa e ficou a espreita, que nem uma criança quando faz arte. Se sentou na beira de um sofá coberto por lençóis esperando que ela desistisse de descobrir quem a chamara. Mas isso era ridículo. E Lucila sabia. Cedo ou tarde as duas se encontrariam e é claro Manú saberia que foi Lucila quem a chamou. Lucila respirou e saiu novamente da casa.
Manú não estava mais em seu jardim. Lucila ainda andou um pouco em direção a casa vizinha, mas não viu ninguém.
Sua cabeça voltou a doer e agora sentia uma fome anormal. Felizmente da cozinha vinha um cheiro convidativo. Flávio acabava de fazer um espaguete que foi devorado pelos cinco.
Lucila não contou nada sobre Manú, pois teria que explicar sobre as trapaças de Juca e Bruna havia lhe pedido segredo. Apesar da amiga fujona não merecer, Lucila se sentia responsável por isso. Ela e Rafa eram donos deste segredo.
Na mesa, enquanto todos comiam, Flávio perguntou:
- Que diabos que você tava falando em bebunzinha? Que amiga que ta grávida? Você ta grávida? O que é que você ficava repetindo???
Lucila engoliu o macarrão e sacudiu a cabeça dando a entender que não sabia do que Flávio estava falando. Por dentro estava apavorada, com medo de ter contado mais alguma coisa. Sentia-se cansada com essa história e ainda Manú na casa ao lado. Precisava de um apoio. Precisava muito de Rafa. Ele saberia como lidar com isso. Com certeza se Manú soubesse algo sobre o paradeiro de Bruna, ele saberia como arrancar esta informação. Mas Rafa estava na Bahia e certamente nem se lembrava dessa história, ou mesmo dela.
Lucila se sentiu deprimida. E ficou ainda mais triste por enxergar um velho e conhecido sentimento. Ela sabia, mas não queria acreditar que novamente estava envolvida por Rafa. Ela não esperava mais mudanças e sabia que ela e Rafa não dariam certo. Teve raiva em pensar porque isso estava acontecendo. Porque ela não podia sentir isso por outra pessoa? Alguém em quem pudesse realmente ter uma relação segura, séria. Será que nunca iria se livrar deste fantasma? Será que ele era tudo que a vida tinha pra ela? Um homem lindo, divertido, simpático e completamente cafajeste? Lucila merecia mais do que isso, e sabia disso. A razão e a emoção se debatiam dentro dela. O medo de que nada melhor aparecesse e de que Rafa fosse realmente sua única opção. Eram anos tentando fazer funcionar esse relacionamento. E a cada volta era pior. Mais ciúmes de Lucila, mais mentiras de Rafa. Não havia tranqüilidade. Não era isso que ela queria, mas seu coração ainda o tinha lá dentro. Só estava adormecido, o sentimento sempre esteve lá e agora acordou. Lucila chorou.
sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009
CAPÍTULO 13
Era Natal e Lucila teria que fazer sua via sacra de todos os anos: se dividir entre as festas de natal de sua mãe e de seu pai, que agora tinham cada um, uma nova família. Mesmo a moral de ser filha única do casal, nunca valeu pra convencer um dos dois em abrir mão em comemorar o Natal na noite do dia 24. Então ela todos os anos jantava duas vezes, abria presentes duas vezes e ainda tinha que agüentar a pressão vinda das duas famílias sobre arrumar um namorado, casar, filhos, etc.
Lucila odiava a noite de natal, a não ser pela sua irmãzinha por parte de pai, que hoje tinha oito anos e adorava Lucila. Mariana era uma criança muito engraçada, falante, espevitada. Apesar da pouca idade, adorava bijuterias, vestidos, sapatos e já contava historias sobre seus namoradinhos de colégio. A irmã mais velha adorava ouvir. Era como se lembrasse de si mesma aos oito anos e toda a ingenuidade do amor eterno, das paixões fulminantes. Era tudo tão simples naquela época.
Comprou um estojo de maquiagem pra irmã, que claro adorou e logo foi usando todas as sombras, batons, esmaltes. Nela e em Lucila, que a certa altura, parecia uma palhaça de tantas cores que tinha em seu rosto. Mas ela não se incomodava. De tudo que tinha que passar naquela confusa noite, Mariana era seu melhor momento.
Depois do jantar, seu pai sentou-se ao seu lado e começaram aquele papo tradicional sobre o escritório, o apartamento, etc. Quando Lucila achou que ele iria perguntar sobre as “paqueras”, surpreendentemente ele comentou:
- Encontrei com o Rafa há uns dias. Ele comentou que tem estado com você. – Rindo, deu duas palmadinhas na perna da filha como quem quer ser cúmplice de alguma coisa.
Lucila se limitou a sorrir, chegou a pegar ar pra se defender, mas desistiu. Já estava mesmo na hora de ir para sua segunda festa.
A festa na casa da sua mãe era uma apoteose. Todos os enfeites de Natal possíveis e imaginários estavam no apartamento. Papai Noéis que cantavam, dançava, balançavam sininhos, andavam de motocicleta. Grandes, médios e pequenos. Renas e Anjos de todas as cores e tamanhos. Luzes coloridas em todo o terraço, guirlandas, dois grandes presépios e é claro, uma imensa árvore de Natal. Dona Lena era aficionada por Natal, passava o ano todo comprado besteirinhas, enfeites e todos itens natalinos que existissem. Na noite de Natal, até o papel higiênico é decorado com pequenos trenós.
- Que triste fim para Papai Noel. – falou sozinha no banheiro, tirando alguns resquícios de maquiagem colorida.
Sua família por parte de mãe, além de ser maior, era muito mais “envolvente”. Bom, deixando metáforas de lado, os Souza eram o maior nível de intrometimento e fofoca possível em uma família. Qualquer movimento, era discutido, julgado e decidido ali mesmo, na mesa de jantar. Por isso mesmo, Lucila tinha pavor de abrir a boca em alguma destas reuniões. Qualquer descuido, qualquer palavra a mais gerava um discurso coletivo de sua mãe, suas tias Margarida e Ivone e de seu padrasto.
- Lucila!!!!!!! Meu amor, você está tão amarrotada. Foi a pivetinha da sua irmãzinha que te deixou assim, né? – abraçando Lucila, sua mãe continuava com seu discurso, quase um monólogo, já que a resposta da filha era o que menos interessava.
Depois, começou sua via sacra: cumprimentar a todos e responder dezenas de vezes as mesmas perguntas: “- Não! Não estou namorando”, “- Não estou sendo exigente”, “- Não! Não quero conhecer o primo do irmão do cara que trabalha com você!”
Se alguém também perguntasse sobre sua carreira, poderia explanar obre seu novo projeto e a responsabilidade enorme de assumir este desafio. Iria explicar seus planos, como conduziria o projeto, como sua chefe apostava nela, etc. Mas ninguém perguntou sobre isso. Era mais interessante contar que a filha da prima Néia estava de caso com um homem casado ou que o tio Lino agora saiu do armário e se assumiu como Lina Joyce.
A cabeça doía e Lucila já não conseguia se concentrar em nenhum assunto. Simplesmente começou a fazer mentalmente uma lista do que iria levar pra sua viagem. Sem perceber adormeceu no meio daquela confusão. Quando acordou já estava em clima de fim de festa. A maioria já tinha ido embora. Estava apenas seu padrasto, que meio bêbado dissertava sobre o sexo dos anjos, sua mãe recolhendo os pratos e suas tias cochilando no sofá. Aproveitando esse clima, Lucila louca pra ir pra casa, saiu à francesa.
O Natal passou e o escritório entrou em férias coletivas. Lucila, Carla, Flavio, Tadeu e Marcos estavam com tudo pronto pra partir para Angra. Já haviam combinado horários, quem iria no carro de quem, comprado comidinhas, bebidinhas, etc.
Lucila foi em seu carro junto com Carla. As duas tinham muito assunto, apesar do pouco tempo de amizade. Carla era pessoa fisicamente e ideologicamente mais próxima de Lucila. Elas tinham o mesmo ritmo de vida, era mais fácil se fazer entender. A viagem passou rapidinho.
Chegando lá, a casa ainda estava fechada. Elas foram as primeiras a chegar. Mas tiveram uma terrível surpresa. Elas não acreditavam no que viam. A casa estava toda quebrada, destruída, velha. Lucila e Carla não conseguiam entender de qual ângulo as fotos que estavam no site de locação foram tiradas. Realmente era uma casa grande, com vários quartos e banheiros. Mas estava completamente abandonada. A piscina um dia deve ter sido um lugar bem agradável, mas hoje apresentava uma água verde e lodosa.
O desespero tomou conta das duas. Que sem ação, simplesmente voltaram pro carro e foram beber no bar da esquina. Nada como uma cerveja gelada pra relaxar.
Lucila odiava a noite de natal, a não ser pela sua irmãzinha por parte de pai, que hoje tinha oito anos e adorava Lucila. Mariana era uma criança muito engraçada, falante, espevitada. Apesar da pouca idade, adorava bijuterias, vestidos, sapatos e já contava historias sobre seus namoradinhos de colégio. A irmã mais velha adorava ouvir. Era como se lembrasse de si mesma aos oito anos e toda a ingenuidade do amor eterno, das paixões fulminantes. Era tudo tão simples naquela época.
Comprou um estojo de maquiagem pra irmã, que claro adorou e logo foi usando todas as sombras, batons, esmaltes. Nela e em Lucila, que a certa altura, parecia uma palhaça de tantas cores que tinha em seu rosto. Mas ela não se incomodava. De tudo que tinha que passar naquela confusa noite, Mariana era seu melhor momento.
Depois do jantar, seu pai sentou-se ao seu lado e começaram aquele papo tradicional sobre o escritório, o apartamento, etc. Quando Lucila achou que ele iria perguntar sobre as “paqueras”, surpreendentemente ele comentou:
- Encontrei com o Rafa há uns dias. Ele comentou que tem estado com você. – Rindo, deu duas palmadinhas na perna da filha como quem quer ser cúmplice de alguma coisa.
Lucila se limitou a sorrir, chegou a pegar ar pra se defender, mas desistiu. Já estava mesmo na hora de ir para sua segunda festa.
A festa na casa da sua mãe era uma apoteose. Todos os enfeites de Natal possíveis e imaginários estavam no apartamento. Papai Noéis que cantavam, dançava, balançavam sininhos, andavam de motocicleta. Grandes, médios e pequenos. Renas e Anjos de todas as cores e tamanhos. Luzes coloridas em todo o terraço, guirlandas, dois grandes presépios e é claro, uma imensa árvore de Natal. Dona Lena era aficionada por Natal, passava o ano todo comprado besteirinhas, enfeites e todos itens natalinos que existissem. Na noite de Natal, até o papel higiênico é decorado com pequenos trenós.
- Que triste fim para Papai Noel. – falou sozinha no banheiro, tirando alguns resquícios de maquiagem colorida.
Sua família por parte de mãe, além de ser maior, era muito mais “envolvente”. Bom, deixando metáforas de lado, os Souza eram o maior nível de intrometimento e fofoca possível em uma família. Qualquer movimento, era discutido, julgado e decidido ali mesmo, na mesa de jantar. Por isso mesmo, Lucila tinha pavor de abrir a boca em alguma destas reuniões. Qualquer descuido, qualquer palavra a mais gerava um discurso coletivo de sua mãe, suas tias Margarida e Ivone e de seu padrasto.
- Lucila!!!!!!! Meu amor, você está tão amarrotada. Foi a pivetinha da sua irmãzinha que te deixou assim, né? – abraçando Lucila, sua mãe continuava com seu discurso, quase um monólogo, já que a resposta da filha era o que menos interessava.
Depois, começou sua via sacra: cumprimentar a todos e responder dezenas de vezes as mesmas perguntas: “- Não! Não estou namorando”, “- Não estou sendo exigente”, “- Não! Não quero conhecer o primo do irmão do cara que trabalha com você!”
Se alguém também perguntasse sobre sua carreira, poderia explanar obre seu novo projeto e a responsabilidade enorme de assumir este desafio. Iria explicar seus planos, como conduziria o projeto, como sua chefe apostava nela, etc. Mas ninguém perguntou sobre isso. Era mais interessante contar que a filha da prima Néia estava de caso com um homem casado ou que o tio Lino agora saiu do armário e se assumiu como Lina Joyce.
A cabeça doía e Lucila já não conseguia se concentrar em nenhum assunto. Simplesmente começou a fazer mentalmente uma lista do que iria levar pra sua viagem. Sem perceber adormeceu no meio daquela confusão. Quando acordou já estava em clima de fim de festa. A maioria já tinha ido embora. Estava apenas seu padrasto, que meio bêbado dissertava sobre o sexo dos anjos, sua mãe recolhendo os pratos e suas tias cochilando no sofá. Aproveitando esse clima, Lucila louca pra ir pra casa, saiu à francesa.
O Natal passou e o escritório entrou em férias coletivas. Lucila, Carla, Flavio, Tadeu e Marcos estavam com tudo pronto pra partir para Angra. Já haviam combinado horários, quem iria no carro de quem, comprado comidinhas, bebidinhas, etc.
Lucila foi em seu carro junto com Carla. As duas tinham muito assunto, apesar do pouco tempo de amizade. Carla era pessoa fisicamente e ideologicamente mais próxima de Lucila. Elas tinham o mesmo ritmo de vida, era mais fácil se fazer entender. A viagem passou rapidinho.
Chegando lá, a casa ainda estava fechada. Elas foram as primeiras a chegar. Mas tiveram uma terrível surpresa. Elas não acreditavam no que viam. A casa estava toda quebrada, destruída, velha. Lucila e Carla não conseguiam entender de qual ângulo as fotos que estavam no site de locação foram tiradas. Realmente era uma casa grande, com vários quartos e banheiros. Mas estava completamente abandonada. A piscina um dia deve ter sido um lugar bem agradável, mas hoje apresentava uma água verde e lodosa.
O desespero tomou conta das duas. Que sem ação, simplesmente voltaram pro carro e foram beber no bar da esquina. Nada como uma cerveja gelada pra relaxar.
quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009
CAPÍTULO 12
Era muito distante do seu mundo pensar em ultra-sonografia, gravidez, filhos. Lucila sequer tinha um namorado. Achava que era uma realidade tão diferente da sua e quando pensava nisso automaticamente seu relógio biológico a forçava a fazer contas. E os resultados nunca eram bons.
Tentava imaginar o que se passava na cabeça de Bruna. E qual seria esta sensação, descrita como tão maravilhosa, de carregar um filho na barriga. Gostaria de estar ao lado da amiga desde a descoberta. Gostaria que ela mesma tivesse contado sobre a gravidez. Se sentia uma intrusa agora, forçando a barra para participar de um momento que Bruna não quis dividir.
Neste ponto Ana estava certa, como Bruna pode guardar a gravidez em segredo. Elas não tinham segredos.
Ainda pensando sobre isso Lucila entrou no estacionamento do prédio da Dra Renata. Não viu o carro de Bruna. Subiu pelo elevador e respirou fundo antes de tocar o interfone. A porta se abriu e Bruna não estava na sala de espera. Lucila não estranhou porque Bruna sempre se atrasava e ainda faltavam dez minutos para o horário da consulta.
Se sentou, pegou uma revista de fofocas e esperou. Vinte minutos depois Bruna entrou acompanhada. Lucila levou um susto ao ver aquele homem de terno ao seu lado. Mas Bruna levou um susto ainda maior, mal conseguiu pronunciar o nome da amiga:
- Lucila? O que você está fazendo aqui? – largando rapidamente a mão do seu acompanhante, perguntou com um olhar confuso, quase envergonhado.
- Ué? Eu vim saber se meu sobrinho é menina ou menino – rindo, quase sarcástica, Lucila se levantou e colocou a mão sobre a barriga de Bruna. Depois olhou para o lado e sem titubear, perguntou à amiga:
- E esse aí? Quem é?
O rapaz deu um passo a frente e com um sorriso quase simpático se apresentou:
- Marcelo Zacaro, prazer em conhecê-la. A Bruninha fala muito de você.
Bruninha? Como assim? Quem era esse cara? O que Bruna estava fazendo com ele na sua primeira ultra?
Sentindo a confusão de Lucila, Bruna que retomou sua calma habitual, falou:
- Lú, vamos entrar que a Dra. Renata está nos esperando. Você pode nos esperar aqui? A gente pode conversar melhor depois Eu vou te explicar tudo.
Mas Lucila não podia ficar. Estava no meio do seu expediente. Então fez Bruna prometer que ligaria no fim do dia. Elas se encontrariam e colocariam os pingos nos “is”.
Chegando no escritório novamente Lucila novamente teve o impulso de ligar pra Rafa e contar suas evoluções nas investigações. Mas não podia ligar. Não sabia o que dizer e sentia um arrepio só de pensar em ter que falar com ele de novo.
– Ele está se esbaldando na Bahia – falou baixinho pra si mesma.
Ainda encucada com o tal Marcelo Zacaro, resolveu dar um Google pra ver o que aparecia. Não acreditou no que viu. Ele era nada mais, nada menos que diretor-conselheiro da JAHE. Seu nome aparecia nos relatórios financeiro da JAHE, na home Page da empresa e em alguns artigos de revistas especializadas em materiais hospitalares. Através de um breve currículo que abria uma das entrevistas, Lucila descobriu que era solteiro, tinha 38 anos e médico por formação. Resolveu mudar sua carreira para área de equipamentos, então fez engenharia e vários cursos de especialização. Falava três línguas e como relembrava a foto, era um homem bonito.
Se Lucila não estava entendendo nada antes, agora não conseguia fazer nenhuma conexão coerente.
Bruna precisaria explicar muito bem essa história.
Mas Bruna não ligou.
Tentava imaginar o que se passava na cabeça de Bruna. E qual seria esta sensação, descrita como tão maravilhosa, de carregar um filho na barriga. Gostaria de estar ao lado da amiga desde a descoberta. Gostaria que ela mesma tivesse contado sobre a gravidez. Se sentia uma intrusa agora, forçando a barra para participar de um momento que Bruna não quis dividir.
Neste ponto Ana estava certa, como Bruna pode guardar a gravidez em segredo. Elas não tinham segredos.
Ainda pensando sobre isso Lucila entrou no estacionamento do prédio da Dra Renata. Não viu o carro de Bruna. Subiu pelo elevador e respirou fundo antes de tocar o interfone. A porta se abriu e Bruna não estava na sala de espera. Lucila não estranhou porque Bruna sempre se atrasava e ainda faltavam dez minutos para o horário da consulta.
Se sentou, pegou uma revista de fofocas e esperou. Vinte minutos depois Bruna entrou acompanhada. Lucila levou um susto ao ver aquele homem de terno ao seu lado. Mas Bruna levou um susto ainda maior, mal conseguiu pronunciar o nome da amiga:
- Lucila? O que você está fazendo aqui? – largando rapidamente a mão do seu acompanhante, perguntou com um olhar confuso, quase envergonhado.
- Ué? Eu vim saber se meu sobrinho é menina ou menino – rindo, quase sarcástica, Lucila se levantou e colocou a mão sobre a barriga de Bruna. Depois olhou para o lado e sem titubear, perguntou à amiga:
- E esse aí? Quem é?
O rapaz deu um passo a frente e com um sorriso quase simpático se apresentou:
- Marcelo Zacaro, prazer em conhecê-la. A Bruninha fala muito de você.
Bruninha? Como assim? Quem era esse cara? O que Bruna estava fazendo com ele na sua primeira ultra?
Sentindo a confusão de Lucila, Bruna que retomou sua calma habitual, falou:
- Lú, vamos entrar que a Dra. Renata está nos esperando. Você pode nos esperar aqui? A gente pode conversar melhor depois Eu vou te explicar tudo.
Mas Lucila não podia ficar. Estava no meio do seu expediente. Então fez Bruna prometer que ligaria no fim do dia. Elas se encontrariam e colocariam os pingos nos “is”.
Chegando no escritório novamente Lucila novamente teve o impulso de ligar pra Rafa e contar suas evoluções nas investigações. Mas não podia ligar. Não sabia o que dizer e sentia um arrepio só de pensar em ter que falar com ele de novo.
– Ele está se esbaldando na Bahia – falou baixinho pra si mesma.
Ainda encucada com o tal Marcelo Zacaro, resolveu dar um Google pra ver o que aparecia. Não acreditou no que viu. Ele era nada mais, nada menos que diretor-conselheiro da JAHE. Seu nome aparecia nos relatórios financeiro da JAHE, na home Page da empresa e em alguns artigos de revistas especializadas em materiais hospitalares. Através de um breve currículo que abria uma das entrevistas, Lucila descobriu que era solteiro, tinha 38 anos e médico por formação. Resolveu mudar sua carreira para área de equipamentos, então fez engenharia e vários cursos de especialização. Falava três línguas e como relembrava a foto, era um homem bonito.
Se Lucila não estava entendendo nada antes, agora não conseguia fazer nenhuma conexão coerente.
Bruna precisaria explicar muito bem essa história.
Mas Bruna não ligou.
segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009
CAPÍTULO 11
A semana terminou e nenhuma notícia de Bruna. Rafa e Lucila se falavam diariamente, mas tanto um quanto o outro não tinham nenhuma nova pista, o que levava sempre a conversa para outro rumo até que um dos dois se dava conta e retomava o assunto sobre Bruna. Lucila gostava de falar com ele, e se via frustrada quando ele não ligava. Não percebia muito bem que aos poucos os dois já riam das velhas piadas, se tratavam com carinho e era cada vez mais difícil terminar as ligações. Mas era só um momento bom do dia, nenhum dos dois valorizava ou esperava mais do que aquilo. Bruna tinha virado uma boa desculpa para que eles pudessem ter aquele papo tão fácil, que fluía tão bem.
Lucila estava a mil com seu novo projeto e com os últimos preparativos para sua viagem para Angra. Faltando menos de uma semana para o réveillon e nada de vestido, ela precisou montar um esquadrão da moda pra ajudá-la nesta missão. Partiu para o shopping munida dos purpurinados Marcos, Flávio e Tadeu, os melhores personal stylist que uma mulher poderia ter. Partiram em busca do vestido vermelho.
As vésperas do Natal, o shopping parecia um formigueiro, mas isso não desencorajou o time. Lucila tinha a crença de que a cor e a qualidade do vestido determinariam o sucesso do seu amor no ano novo. Entraram e saíram de lojas, Lucila experimentou diversos modelos até que achou o que estava procurando. Gritinhos de seus amigos comemoraram o sucesso da missão.
Estavam todos animados com a idéia de tirar uns dias de folga. Com o projeto da joalheria todos ficaram atolados de trabalho, precisavam realmente de uns dias de folga. Lucila também estava feliz com a idéia, mas nem tanto como deveria. Tadeu com sua língua afiada, alfinetou:
- Será que onde Rafa estará no fim do ano o celular pega? Afinal vocês precisam se falar caso algo novo aconteça no capítulo Bruna – com um sorrisinho malicioso olhou de lado pros amigos.
Lucila havia contato a eles sobre o sumiço de Bruna, mas conseguiu se controlar sobre a parte dos documentos e da possibilidade da denúncia. Apenas comentou que pediu ajuda ao Rafa para encontrar a amiga. Desde então, Tadeu, Marcos, Flavinho e Carla presenciavam diariamente a mesma cena: Lucila em um canto do escritório falando baixinho ao telefone e soltando alguns sorrisinhos. Mas ela não tinha consciência disso, então respondeu sem perceber o sarcasmo do amigo:
- Nossa! Não tinha pensado nisso! Meu Deus e se Bruna tentar falar comigo também? Lá o celular pega, não pega? Tenho que avisar isso ao Rafa.
Flavio, Tadeu e Marcos começaram a rir do desespero da amiga e principalmente da enorme bandeira que ela estava dando. Preocupada com uma emergência? Sério?
Imediatamente Lucila negou qualquer possibilidade de ter algo novamente com Rafa. Repetiu que a história deles já teria acabado, blá, blá, blá. Tentava ser convincente, mas nem ela estava totalmente certa disso.
Com o vestido nas mãos, o quarteto voltou ao escritório. No caminho falavam sobre a viagem. Lucila queria saber se haveriam heterossexuais na casa onde eles ficariam. Ela sabia que pelo menos Carla estava encarregada de levar alguns rapazes. Ela levaria os primos e dois amigos. Já a ala gay da casa também estava confirmada: o casal Flavio e Tadeu, Marcos e alguns amigos.
Lucila e Carla estavam apostando em desencalhar neste réveillon. Desde o início do mês Carla já tinha seu vestido, biquínis e todo o enxoval para Angra.
Carla trabalhava a pouco tempo no escritório, mas rapidamente entrou para o grupo. Era animada e topava qualquer programa, desde que este oferecesse uma oportunidade mesmo que remota de conhecer alguém pra namorar. Carla sofria com a sua solterisse. E aos 28 anos se achava velha demais pra não ter um namorado. Essa ansiedade a atrapalhava sempre. Qualquer homem que ela conhecia era atropelado por tantas expectativas e tanto medo de desagradar, que acabava desagradando.
Os quatro chegaram ao escritório e logo encontraram Carla. Ela não pode ir almoçar com eles, pois mais uma vez Clô não havia aparecido, pois estava com alguma de suas doenças. Carla sempre precisava ficar em seu lugar. Logo que o grupo chegou, ela falou:
- E aí crianças? Missão cumprida?
Sem a menor discrição, Tadeu foi logo respondendo:
- Claro, né? A gente aqui não brinca em serviço. Lucila estará MA-RA-VI-LHO-SA neste réveillon. Você que se cuide. – rindo, abraçou Carla que já ensaiava uma cara de preocupação.
Lucila estava indo em direção ao banheiro quando, Carla a chamou de volta:
- Lucila! Lú! Aonde você vai??? Já viu o que está na sua mesa?
Ela não tinha visto o enorme arranjo de flores do campo sobre a mesa. Era uma cesta branca em vime com um pequeno laço de fitas. Não era exatamente elegante, mas eram flores. E flores sempre são flores. Correu para procurar o cartão que estava escondido entre as flores e o papel. Abriu nervosa pensando nas possibilidades, que não eram muitas. Respirando fundo, leu o cartão:
Brincar de detetive neste fim de ano me fez descobri bem mais do que eu esperava.
Feliz ano novo!
Beijo,
Rafa
PS: viajo hoje para a Bahia. Celular ligado.
Lucila tinha que admitir pra si mesma que nenhum outro nome lhe veio a cabeça quando tentava adivinhar quem havia lhe mandado aquelas flores. Se viu nervosa, confusa. Na hora fez força pra lembrar tudo que Rafa tinha a feito passar enquanto namoraram. Nada parecia tão grave naquele momento.
A sua volta a platéia aguardava a confirmação de que as flores eram mesmo de Rafa. Sem dizer nada Lucila entregou o cartão para Tadeu, que leu para os demais. Suspiros no ar e palminhas aninmadas. Até que Carla a fitou e disse:
- É bem dele mesmo, né? Vai pegar geral em Salvador, mas quer logo deixar uma otária garantida pra volta.
Por mais grosseira que fosse a afirmação, era muito verdadeira. Lucila reconhecia que Rafa sabia usar muito bem as palavras e as ferramentas certas pra seduzir uma mulher. Ainda mais ela, que ele conhecia como a palma da sua mão.
Fazendo sinal para que todos a deixassem trabalhar, Lucila tentou se concentrar em seu projeto. Quando estava finalmente entretida no trabalho, do nada se lembrou de que a Dra Renata havia comentado que Bruna teria uma ultra no dia seguinte. Era a chance delas se encontrarem. Quase instintivamente pegou o telefone e começou a discar o número de Rafa. Foi quando olhou para as flores e desligou correndo.
Lucila iria resolver isso sozinha.
Lucila estava a mil com seu novo projeto e com os últimos preparativos para sua viagem para Angra. Faltando menos de uma semana para o réveillon e nada de vestido, ela precisou montar um esquadrão da moda pra ajudá-la nesta missão. Partiu para o shopping munida dos purpurinados Marcos, Flávio e Tadeu, os melhores personal stylist que uma mulher poderia ter. Partiram em busca do vestido vermelho.
As vésperas do Natal, o shopping parecia um formigueiro, mas isso não desencorajou o time. Lucila tinha a crença de que a cor e a qualidade do vestido determinariam o sucesso do seu amor no ano novo. Entraram e saíram de lojas, Lucila experimentou diversos modelos até que achou o que estava procurando. Gritinhos de seus amigos comemoraram o sucesso da missão.
Estavam todos animados com a idéia de tirar uns dias de folga. Com o projeto da joalheria todos ficaram atolados de trabalho, precisavam realmente de uns dias de folga. Lucila também estava feliz com a idéia, mas nem tanto como deveria. Tadeu com sua língua afiada, alfinetou:
- Será que onde Rafa estará no fim do ano o celular pega? Afinal vocês precisam se falar caso algo novo aconteça no capítulo Bruna – com um sorrisinho malicioso olhou de lado pros amigos.
Lucila havia contato a eles sobre o sumiço de Bruna, mas conseguiu se controlar sobre a parte dos documentos e da possibilidade da denúncia. Apenas comentou que pediu ajuda ao Rafa para encontrar a amiga. Desde então, Tadeu, Marcos, Flavinho e Carla presenciavam diariamente a mesma cena: Lucila em um canto do escritório falando baixinho ao telefone e soltando alguns sorrisinhos. Mas ela não tinha consciência disso, então respondeu sem perceber o sarcasmo do amigo:
- Nossa! Não tinha pensado nisso! Meu Deus e se Bruna tentar falar comigo também? Lá o celular pega, não pega? Tenho que avisar isso ao Rafa.
Flavio, Tadeu e Marcos começaram a rir do desespero da amiga e principalmente da enorme bandeira que ela estava dando. Preocupada com uma emergência? Sério?
Imediatamente Lucila negou qualquer possibilidade de ter algo novamente com Rafa. Repetiu que a história deles já teria acabado, blá, blá, blá. Tentava ser convincente, mas nem ela estava totalmente certa disso.
Com o vestido nas mãos, o quarteto voltou ao escritório. No caminho falavam sobre a viagem. Lucila queria saber se haveriam heterossexuais na casa onde eles ficariam. Ela sabia que pelo menos Carla estava encarregada de levar alguns rapazes. Ela levaria os primos e dois amigos. Já a ala gay da casa também estava confirmada: o casal Flavio e Tadeu, Marcos e alguns amigos.
Lucila e Carla estavam apostando em desencalhar neste réveillon. Desde o início do mês Carla já tinha seu vestido, biquínis e todo o enxoval para Angra.
Carla trabalhava a pouco tempo no escritório, mas rapidamente entrou para o grupo. Era animada e topava qualquer programa, desde que este oferecesse uma oportunidade mesmo que remota de conhecer alguém pra namorar. Carla sofria com a sua solterisse. E aos 28 anos se achava velha demais pra não ter um namorado. Essa ansiedade a atrapalhava sempre. Qualquer homem que ela conhecia era atropelado por tantas expectativas e tanto medo de desagradar, que acabava desagradando.
Os quatro chegaram ao escritório e logo encontraram Carla. Ela não pode ir almoçar com eles, pois mais uma vez Clô não havia aparecido, pois estava com alguma de suas doenças. Carla sempre precisava ficar em seu lugar. Logo que o grupo chegou, ela falou:
- E aí crianças? Missão cumprida?
Sem a menor discrição, Tadeu foi logo respondendo:
- Claro, né? A gente aqui não brinca em serviço. Lucila estará MA-RA-VI-LHO-SA neste réveillon. Você que se cuide. – rindo, abraçou Carla que já ensaiava uma cara de preocupação.
Lucila estava indo em direção ao banheiro quando, Carla a chamou de volta:
- Lucila! Lú! Aonde você vai??? Já viu o que está na sua mesa?
Ela não tinha visto o enorme arranjo de flores do campo sobre a mesa. Era uma cesta branca em vime com um pequeno laço de fitas. Não era exatamente elegante, mas eram flores. E flores sempre são flores. Correu para procurar o cartão que estava escondido entre as flores e o papel. Abriu nervosa pensando nas possibilidades, que não eram muitas. Respirando fundo, leu o cartão:
Brincar de detetive neste fim de ano me fez descobri bem mais do que eu esperava.
Feliz ano novo!
Beijo,
Rafa
PS: viajo hoje para a Bahia. Celular ligado.
Lucila tinha que admitir pra si mesma que nenhum outro nome lhe veio a cabeça quando tentava adivinhar quem havia lhe mandado aquelas flores. Se viu nervosa, confusa. Na hora fez força pra lembrar tudo que Rafa tinha a feito passar enquanto namoraram. Nada parecia tão grave naquele momento.
A sua volta a platéia aguardava a confirmação de que as flores eram mesmo de Rafa. Sem dizer nada Lucila entregou o cartão para Tadeu, que leu para os demais. Suspiros no ar e palminhas aninmadas. Até que Carla a fitou e disse:
- É bem dele mesmo, né? Vai pegar geral em Salvador, mas quer logo deixar uma otária garantida pra volta.
Por mais grosseira que fosse a afirmação, era muito verdadeira. Lucila reconhecia que Rafa sabia usar muito bem as palavras e as ferramentas certas pra seduzir uma mulher. Ainda mais ela, que ele conhecia como a palma da sua mão.
Fazendo sinal para que todos a deixassem trabalhar, Lucila tentou se concentrar em seu projeto. Quando estava finalmente entretida no trabalho, do nada se lembrou de que a Dra Renata havia comentado que Bruna teria uma ultra no dia seguinte. Era a chance delas se encontrarem. Quase instintivamente pegou o telefone e começou a discar o número de Rafa. Foi quando olhou para as flores e desligou correndo.
Lucila iria resolver isso sozinha.
quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009
CAPÍTULO 10
Lucila mal entrou no escritório e Bardot, sua chefe, a recebeu com um milhão de papéis na mão. Falava sem parar sobre o projeto que acabara de conquistar e queria que Lucila tocasse junto com ela. Era um projeto para uma joalheria que seria inaugurada em alguns meses. “Pouco tempo” – pensou Lucila, mas ainda assim, vibrava com a possibilidade de tocar um job como este ao lado de Bardot.
Com a entrada deste novo cliente, Bardot havia remanejado os projetos de Lucila entre Flávio e Tadeu. Ela precisaria de tempo para se dedicar à joalheria.
Empolgada, Lucila deu pulinhos em direção à sua mesa. Imediatamente começou a ler entusiasmada os papéis que Bardot lhe entregara. Podia se esquecer do mundo lá fora. E foi o que aconteceu. Só percebeu a hora quando o escritório foi ficando escuro e vazio. Já eram quase dez horas da noite, a barriga dava sinais de vazia, precisava ir embora.
Mais uma vez os planos de ir ao shopping tiveram que ser adiados e mais uma vez havia esquecido a consulta com sua ginecologista. Amanhã tentaria remarcar.
A caminho de casa passou em um posto e comprou dois sanduíches naturais e um suco em garrafa. Sabia que em casa a geladeira estaria vazia. Mas isso não era problema. Ela não era uma dona de casa. Era uma profissional atribulada.
Lucila como uma boa geminiana, era totalmente inconstante, qualquer coisa poderia mudar seu humor e seu modo de ver a própria vida. Neste momento, empolgada com seu novo projeto, se sentia uma profissional de sucesso. Dirigia se sentindo importante, fazia planos sobre sua carreira e podia se imaginar daqui a poucos anos em seu próprio escritório atendendo seu clientes e dando entrevistas a revistas especializadas. Ela era um sucesso! Pelo menos naquele instante. Afinal, há poucos dias Lucila se arrastava pro trabalho e duvidava da sua aptidão profissional. Se sentia sozinha, incompetente, feia e gorda. Era a pior das mulheres. Mas isso passou! Agora pra quê homens? Era uma executiva brilhante e como tal iria se preocupar com sua carreira.
Chegando em casa a secretária eletrônica avisava uma mensagem. Era Bruna:
- Amiga, sei que você pode estar preocupada comigo, mas liguei pra dizer que estou bem. Não se preocupe. Assim que puder volto a dar notícias. E por favor, não conte a ninguém sobre os documentos. Estou bem, ok? Beijo!
Tão envolvida em seu novo estado de espírito, que se esqueceu completamente de Bruna, Juca, Rafa e toda aquela confusão. Bruna, mais uma vez não dava nenhuma pista do que estava acontecendo, mas parecia bem. Pensou em ligar pra Rafa, mas desistiu.
No dia seguinte, conseguiu remarcar sua ginecologista e na hora do almoço foi até lá em um horário encaixado. A Dra. Renata era sempre muito simpática, a não ser pelo fato de sempre começar a consulta com a mesma pergunta:
- Namorando? Ficando? Como estamos com esta vidinha amorosa?
Nas últimas consultas, a resposta tinha sido a mesma: - Nada. - E nesta não seria diferente. Depois da pergunta habitué, Dra Renata complementou seu discurso constrangedor:
- Olha lá, hein Lucila? Não vai ficar pra titia cuidando dos filhos das amigas, hein? Precisa arrumar um amiguinho pra brincar com filho da Bruna!
Filho da Bruna? Como assim? Sua amiga Bruna também era paciente da Dra. Renata, mas ela estava foragida e não grávida? Ou estava?
Com vergonha de revelar que não sabia que sua melhor amiga estava grávida, jogou verde:
- É pois é, né? Mas tem tempo. De quantos meses mesmo a Bruna está?
- Dez semanas. Já marcamos a ultra pra próxima quarta.
- Próxima quarta? Ah que ótimo! Ela está muito feliz não está?
- Olha, Lú, parece assustada. Acho que não esperava engravidar tão rápido. Mas logo, logo ela e o marido começarão a curtir a gravidez, saber o sexo, comprar roupinhas. É assim mesmo.
- Juca veio com ela? – disse Lucila com um tom de surpresa, que logo tentou corrigir, assumindo uma postura mais calma: - É quer dizer. Ele é tão ocupado com os negócios.
- Não pode vir, acredito que seja por isso mesmo. Mas apaixonado do jeito que ele é, já já vai se tornar um pai babão.
Completamente atordoada, mas tentando disfarçar, Lucila concordou com a cabeça. Bruna estava grávida e estava no Rio, pois havia marcado uma ultra pra próxima quarta-feira. Porque ela não contou? Será que foi isso que a fez desistir de denunciar o Juca? Será que Juca sabe sobre a gravidez?
A caminho do escritório ligou pra Rafa. Precisava contar o que acabava de saber. Mas ele não estava. Deixou recado.
Então resolveu ligar para Ana, talvez soubesse da gravidez de Bruna. As três nunca escondiam nada uma das outras. Ana estava também em sua hora de almoço, provando docinhos para seu casamento. Apesar da boca cheia, ouviu Lucila e também ficou surpresa. Ela também não sabia de nada e ficou revoltada com o fato de Bruna não ter se preocupado em ligar ou mandar qualquer mensagem pra ela.
Ana era muito ciumenta, Bruna e Lucila sempre tinham que balancear as conversas, presentes e qualquer atitude para que a amiga não se sentisse rejeitada. Era o que acontecia agora. Ela não aceitava que Bruna só tivesse mandado recados pra Lucila e nada pra ela. Nem mesmo contou sobre a separação ou sobre o escândalo da JAEH.
Lucila tentava amenizar dizendo que certamente Bruna contaria mais tarde, mas que alguma coisa estranha havia acontecido pra ela sumir e aparentemente desistir de denunciar o ex- marido. As duas ainda ficaram alguns minutos chutando possibilidades, mas desistiram.
Lucila precisava voltar ao trabalho, afinal era uma arquiteta responsável e com um grande projeto em suas mãos. Depois cuidaria deste assunto.
Com a entrada deste novo cliente, Bardot havia remanejado os projetos de Lucila entre Flávio e Tadeu. Ela precisaria de tempo para se dedicar à joalheria.
Empolgada, Lucila deu pulinhos em direção à sua mesa. Imediatamente começou a ler entusiasmada os papéis que Bardot lhe entregara. Podia se esquecer do mundo lá fora. E foi o que aconteceu. Só percebeu a hora quando o escritório foi ficando escuro e vazio. Já eram quase dez horas da noite, a barriga dava sinais de vazia, precisava ir embora.
Mais uma vez os planos de ir ao shopping tiveram que ser adiados e mais uma vez havia esquecido a consulta com sua ginecologista. Amanhã tentaria remarcar.
A caminho de casa passou em um posto e comprou dois sanduíches naturais e um suco em garrafa. Sabia que em casa a geladeira estaria vazia. Mas isso não era problema. Ela não era uma dona de casa. Era uma profissional atribulada.
Lucila como uma boa geminiana, era totalmente inconstante, qualquer coisa poderia mudar seu humor e seu modo de ver a própria vida. Neste momento, empolgada com seu novo projeto, se sentia uma profissional de sucesso. Dirigia se sentindo importante, fazia planos sobre sua carreira e podia se imaginar daqui a poucos anos em seu próprio escritório atendendo seu clientes e dando entrevistas a revistas especializadas. Ela era um sucesso! Pelo menos naquele instante. Afinal, há poucos dias Lucila se arrastava pro trabalho e duvidava da sua aptidão profissional. Se sentia sozinha, incompetente, feia e gorda. Era a pior das mulheres. Mas isso passou! Agora pra quê homens? Era uma executiva brilhante e como tal iria se preocupar com sua carreira.
Chegando em casa a secretária eletrônica avisava uma mensagem. Era Bruna:
- Amiga, sei que você pode estar preocupada comigo, mas liguei pra dizer que estou bem. Não se preocupe. Assim que puder volto a dar notícias. E por favor, não conte a ninguém sobre os documentos. Estou bem, ok? Beijo!
Tão envolvida em seu novo estado de espírito, que se esqueceu completamente de Bruna, Juca, Rafa e toda aquela confusão. Bruna, mais uma vez não dava nenhuma pista do que estava acontecendo, mas parecia bem. Pensou em ligar pra Rafa, mas desistiu.
No dia seguinte, conseguiu remarcar sua ginecologista e na hora do almoço foi até lá em um horário encaixado. A Dra. Renata era sempre muito simpática, a não ser pelo fato de sempre começar a consulta com a mesma pergunta:
- Namorando? Ficando? Como estamos com esta vidinha amorosa?
Nas últimas consultas, a resposta tinha sido a mesma: - Nada. - E nesta não seria diferente. Depois da pergunta habitué, Dra Renata complementou seu discurso constrangedor:
- Olha lá, hein Lucila? Não vai ficar pra titia cuidando dos filhos das amigas, hein? Precisa arrumar um amiguinho pra brincar com filho da Bruna!
Filho da Bruna? Como assim? Sua amiga Bruna também era paciente da Dra. Renata, mas ela estava foragida e não grávida? Ou estava?
Com vergonha de revelar que não sabia que sua melhor amiga estava grávida, jogou verde:
- É pois é, né? Mas tem tempo. De quantos meses mesmo a Bruna está?
- Dez semanas. Já marcamos a ultra pra próxima quarta.
- Próxima quarta? Ah que ótimo! Ela está muito feliz não está?
- Olha, Lú, parece assustada. Acho que não esperava engravidar tão rápido. Mas logo, logo ela e o marido começarão a curtir a gravidez, saber o sexo, comprar roupinhas. É assim mesmo.
- Juca veio com ela? – disse Lucila com um tom de surpresa, que logo tentou corrigir, assumindo uma postura mais calma: - É quer dizer. Ele é tão ocupado com os negócios.
- Não pode vir, acredito que seja por isso mesmo. Mas apaixonado do jeito que ele é, já já vai se tornar um pai babão.
Completamente atordoada, mas tentando disfarçar, Lucila concordou com a cabeça. Bruna estava grávida e estava no Rio, pois havia marcado uma ultra pra próxima quarta-feira. Porque ela não contou? Será que foi isso que a fez desistir de denunciar o Juca? Será que Juca sabe sobre a gravidez?
A caminho do escritório ligou pra Rafa. Precisava contar o que acabava de saber. Mas ele não estava. Deixou recado.
Então resolveu ligar para Ana, talvez soubesse da gravidez de Bruna. As três nunca escondiam nada uma das outras. Ana estava também em sua hora de almoço, provando docinhos para seu casamento. Apesar da boca cheia, ouviu Lucila e também ficou surpresa. Ela também não sabia de nada e ficou revoltada com o fato de Bruna não ter se preocupado em ligar ou mandar qualquer mensagem pra ela.
Ana era muito ciumenta, Bruna e Lucila sempre tinham que balancear as conversas, presentes e qualquer atitude para que a amiga não se sentisse rejeitada. Era o que acontecia agora. Ela não aceitava que Bruna só tivesse mandado recados pra Lucila e nada pra ela. Nem mesmo contou sobre a separação ou sobre o escândalo da JAEH.
Lucila tentava amenizar dizendo que certamente Bruna contaria mais tarde, mas que alguma coisa estranha havia acontecido pra ela sumir e aparentemente desistir de denunciar o ex- marido. As duas ainda ficaram alguns minutos chutando possibilidades, mas desistiram.
Lucila precisava voltar ao trabalho, afinal era uma arquiteta responsável e com um grande projeto em suas mãos. Depois cuidaria deste assunto.
segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009
CAPÍTULO 9
Assim que abriu a porta, sentiu um friozinho na barriga, mas conseguiu disfarçar. Forçou a se lembrar do motivo que levara Rafa até lá. Assim, podia ficar mais a vontade, sabendo que era tudo em favor de uma grande amiga.
Rafa deu dois beijinhos no rosto de Lucila e entrou. Sem cerimônia, se sentou no sofá e fez sinal com a cabeça para que ela começasse a contar tudo o que estava acontecendo.
Lucila também dispensou formalidades e contou tudo que sabia para Rafa. Desde o envelope que Bruna havia recebido, descreveu a discussão com Juca e o bilhete deixado por ela. Rafa ouvia tudo com atenção e preocupação. Ironicamente Rafael era muito prestativo quando se tratava de ajudar aos outros. Com a mão na cabeça, como se processasse tudo que tinha ouvido falou:
- Você tem o bilhete ai?
Lucila o entregou. Suas mãos se tocaram levemente, o que os deixou bem desconfortáveis. Os dois fingiram não notar e Rafa continuou:
- O bilhete não prova nada. Só que ela por enquanto não quer expor os documentos. Alguma coisa aconteceu. Precisamos saber o que foi.
- Ela estava tão certa em denunciar o Juca. Ela iria ver seu advogado hoje. Será ela foi? Oh meu Deus será que ele disse alguma coisa pra ela que a fez mudar de idéia e sumir?
Rindo, Rafa a interrompeu:
- Lú, o advogado dela sou eu. Realmente ela marcou um horário comigo hoje à tarde.
Mas logo depois ligou pra minha secretária desmarcando. Como ela não mencionou nada, eu não sabia da gravidade do assunto. Ah! Eu não podia ter a deixado desmarcar.
- Você não podia adivinhar – sem perceber, Lucila apoiou sua mão sobre o ombro de Rafa. Quando se deu conta do seu gesto, imediatamente a retirou, de uma maneira tão brusca que não poderia ter sido mais estranho.
Mas como toda aquela situação era estranha, os dois, simplesmente tentavam se concentrar no mistério do sumiço de Bruna, deixando os dilemas pessoais de lado.
Nem eles, nem Bruna sabiam quem havia enviado os documentos. E esta pessoa poderia ter relação com a fuga de Bruna. Esse era o X da questão.
Os dois discutiam sobre quem poderia ter acesso a informações tão confidenciais. E concluíram que somente alguém que trabalhasse na JAEH poderia conseguir.
Mas nenhuma outra “luz” apareceu. Já era tarde e o cansaço dos dois era aparente. Então combinaram de dar mais um tempo e esperar alguma notícia de Bruna. Enquanto isso iriam pensar em como descobrir quem seria a pessoa que enviou documentos. Rafael estava certo que descobrindo quem era essa pessoa, descobririam o que houve com Bruna.
Ficaram de se falar no dia seguinte, perto da hora do almoço. Despediram-se como velhos amigos. Lucila agora não se sentia mais tão nervosa na presença de Rafa. Ao contrário, sentia-se segura, como se tivesse alguém pra dividir com ela aquela situação tão inusitada.
Sua amiga num dia estava feliz, casada, fazendo planos, pensando em filhos e no outro estava escondida em algum lugar aparentemente porque seu marido era um ladrão. Meu Deus! Quando iria imaginar algo assim? Lucila se via dentro de um filme. E não era um filme do seu tipo preferido com romance e final feliz.
No dia seguinte Bruna não deu sinal de vida. Lucila sabia que teria que ligar novamente para Rafael. Por mais compreensível que fosse ela não queria fazer isso. Felizmente, seu telefone tocou e era próprio ligando antes que ela pudesse sofrer ainda mais com essa situação.
- Lú? Lucila? É o Rafa, tudo bem? Escuta, Descobri uma coisa importante. Vamos almoçar e eu te conto?
Sem saber como negar, Lucila aceitou.
Quando chegou ao restaurante Rafael a esperava na porta. Os dois trocaram beijos na bochecha e entraram. Sentaram numa mesa perto da janela. Pediram as bebidas e começaram a escolher os pratos. Por um instante o tempo parecia de andado pra trás. Mas não tinha. Eles estavam ali pra resolver uma questão importante. Nada mais.
Rafael tinha um amigo que era advogado na JAEH. Segundo Rafa, Jorge era de total confiança e por isso, o colocou a par de tudo, ou quase tudo, já que não podia explicitar do que se tratavam os documentos. Disse apenas que eram de uso privado da JAEH que tinham sido copiados. Só isso já violava o contrato de sigilo da informação que qualquer funcionário da JAEH era submetido. Contou também que tinham relação com os contratos públicos da empresa. Neste ponto Jorge explicou:
- Todos os contratos públicos, assim como as transações financeiras, são tratados por uma equipe exclusiva. Existe um advogado que redige os contratos e cuida dos tramites legais e um contador também exclusivo para isso. Pra ser sincero, meu amigo, sempre achei isso muito estranho, mas como é Brasil, nada é estranho demais.
Jorge ainda reforçou que não há mais ninguém ligado a estas duas pessoas, nenhuma equipe,, somente Manú e o próprio Juca. Os quatros eram os únicos em toda a empresa que tinham acesso a estas negociações.
Rafael anotou o nome do advogado e do contador, prometendo ao amigo que este favor ficaria em segredo.
Rafael parecia animado em sua função Sherlock Holmes. Contava com entusiasmo sua descoberta. Tinha anotações no seu bloco e prosseguia com suas teorias:
- Dr. Antonio Carlos e Dra. Joana. Estes são os cúmplices de Juca e Manú. – batendo com o lápis no seu bloquinho, fez uma pausa e continuou: - Agora, nenhum deles teria interesse em denunciar este esquema. Eles seriam os primeiros prejudicados. Foi outra pessoa que descobriu e resolveu usar a Bruna pra denunciar. Só pode ser!
Os dois concordavam neste ponto. Não fazia sentido alguém envolvido no esquema fazer a denúncia. Eles tinham que descobrir alguém que provavelmente era muito próximo e poderia conseguir as cópias. Mas quem seria esta pessoa?
O almoço voou. Quando viu a hora, Lucila deu um pulo da cadeira. Precisava voltar pro escritório. Tinha muito serviço e ainda precisaria sair mais cedo para uma consulta médica. Isso sem falar que faltavam poucos dias para o fim do ano e ela ainda não tinha conseguido achar nada para usar no réveillon.
Rafa deu dois beijinhos no rosto de Lucila e entrou. Sem cerimônia, se sentou no sofá e fez sinal com a cabeça para que ela começasse a contar tudo o que estava acontecendo.
Lucila também dispensou formalidades e contou tudo que sabia para Rafa. Desde o envelope que Bruna havia recebido, descreveu a discussão com Juca e o bilhete deixado por ela. Rafa ouvia tudo com atenção e preocupação. Ironicamente Rafael era muito prestativo quando se tratava de ajudar aos outros. Com a mão na cabeça, como se processasse tudo que tinha ouvido falou:
- Você tem o bilhete ai?
Lucila o entregou. Suas mãos se tocaram levemente, o que os deixou bem desconfortáveis. Os dois fingiram não notar e Rafa continuou:
- O bilhete não prova nada. Só que ela por enquanto não quer expor os documentos. Alguma coisa aconteceu. Precisamos saber o que foi.
- Ela estava tão certa em denunciar o Juca. Ela iria ver seu advogado hoje. Será ela foi? Oh meu Deus será que ele disse alguma coisa pra ela que a fez mudar de idéia e sumir?
Rindo, Rafa a interrompeu:
- Lú, o advogado dela sou eu. Realmente ela marcou um horário comigo hoje à tarde.
Mas logo depois ligou pra minha secretária desmarcando. Como ela não mencionou nada, eu não sabia da gravidade do assunto. Ah! Eu não podia ter a deixado desmarcar.
- Você não podia adivinhar – sem perceber, Lucila apoiou sua mão sobre o ombro de Rafa. Quando se deu conta do seu gesto, imediatamente a retirou, de uma maneira tão brusca que não poderia ter sido mais estranho.
Mas como toda aquela situação era estranha, os dois, simplesmente tentavam se concentrar no mistério do sumiço de Bruna, deixando os dilemas pessoais de lado.
Nem eles, nem Bruna sabiam quem havia enviado os documentos. E esta pessoa poderia ter relação com a fuga de Bruna. Esse era o X da questão.
Os dois discutiam sobre quem poderia ter acesso a informações tão confidenciais. E concluíram que somente alguém que trabalhasse na JAEH poderia conseguir.
Mas nenhuma outra “luz” apareceu. Já era tarde e o cansaço dos dois era aparente. Então combinaram de dar mais um tempo e esperar alguma notícia de Bruna. Enquanto isso iriam pensar em como descobrir quem seria a pessoa que enviou documentos. Rafael estava certo que descobrindo quem era essa pessoa, descobririam o que houve com Bruna.
Ficaram de se falar no dia seguinte, perto da hora do almoço. Despediram-se como velhos amigos. Lucila agora não se sentia mais tão nervosa na presença de Rafa. Ao contrário, sentia-se segura, como se tivesse alguém pra dividir com ela aquela situação tão inusitada.
Sua amiga num dia estava feliz, casada, fazendo planos, pensando em filhos e no outro estava escondida em algum lugar aparentemente porque seu marido era um ladrão. Meu Deus! Quando iria imaginar algo assim? Lucila se via dentro de um filme. E não era um filme do seu tipo preferido com romance e final feliz.
No dia seguinte Bruna não deu sinal de vida. Lucila sabia que teria que ligar novamente para Rafael. Por mais compreensível que fosse ela não queria fazer isso. Felizmente, seu telefone tocou e era próprio ligando antes que ela pudesse sofrer ainda mais com essa situação.
- Lú? Lucila? É o Rafa, tudo bem? Escuta, Descobri uma coisa importante. Vamos almoçar e eu te conto?
Sem saber como negar, Lucila aceitou.
Quando chegou ao restaurante Rafael a esperava na porta. Os dois trocaram beijos na bochecha e entraram. Sentaram numa mesa perto da janela. Pediram as bebidas e começaram a escolher os pratos. Por um instante o tempo parecia de andado pra trás. Mas não tinha. Eles estavam ali pra resolver uma questão importante. Nada mais.
Rafael tinha um amigo que era advogado na JAEH. Segundo Rafa, Jorge era de total confiança e por isso, o colocou a par de tudo, ou quase tudo, já que não podia explicitar do que se tratavam os documentos. Disse apenas que eram de uso privado da JAEH que tinham sido copiados. Só isso já violava o contrato de sigilo da informação que qualquer funcionário da JAEH era submetido. Contou também que tinham relação com os contratos públicos da empresa. Neste ponto Jorge explicou:
- Todos os contratos públicos, assim como as transações financeiras, são tratados por uma equipe exclusiva. Existe um advogado que redige os contratos e cuida dos tramites legais e um contador também exclusivo para isso. Pra ser sincero, meu amigo, sempre achei isso muito estranho, mas como é Brasil, nada é estranho demais.
Jorge ainda reforçou que não há mais ninguém ligado a estas duas pessoas, nenhuma equipe,, somente Manú e o próprio Juca. Os quatros eram os únicos em toda a empresa que tinham acesso a estas negociações.
Rafael anotou o nome do advogado e do contador, prometendo ao amigo que este favor ficaria em segredo.
Rafael parecia animado em sua função Sherlock Holmes. Contava com entusiasmo sua descoberta. Tinha anotações no seu bloco e prosseguia com suas teorias:
- Dr. Antonio Carlos e Dra. Joana. Estes são os cúmplices de Juca e Manú. – batendo com o lápis no seu bloquinho, fez uma pausa e continuou: - Agora, nenhum deles teria interesse em denunciar este esquema. Eles seriam os primeiros prejudicados. Foi outra pessoa que descobriu e resolveu usar a Bruna pra denunciar. Só pode ser!
Os dois concordavam neste ponto. Não fazia sentido alguém envolvido no esquema fazer a denúncia. Eles tinham que descobrir alguém que provavelmente era muito próximo e poderia conseguir as cópias. Mas quem seria esta pessoa?
O almoço voou. Quando viu a hora, Lucila deu um pulo da cadeira. Precisava voltar pro escritório. Tinha muito serviço e ainda precisaria sair mais cedo para uma consulta médica. Isso sem falar que faltavam poucos dias para o fim do ano e ela ainda não tinha conseguido achar nada para usar no réveillon.
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