quarta-feira, 3 de junho de 2009

CAPÍTULO 40

O jantar não tinha sido tão ruim como Lucila esperava. Por algum motivo Cadu estava menos “engraçadinho”. Os dois conseguiram conversar tranqüilamente sobre trabalho e até sobre alguns assuntos pessoais.
Lucila ainda estava curiosa sobre como seria a namorada de Cadu. Não tinha conseguido descobrir muita coisa no jantar. Mas ainda teriam um dia inteiro e toda viagem de volta. E foi na viagem de volta para o Rio, que Lucila perguntou:
- Cadu, você namora há muito tempo?

- Eu? Não. Tem pouco tempo, mas é muito intenso, sabe?

- Quanto tempo?

- Nos conhecemos há menos de um mês. Quer saber como?


Lucila, é claro, respondeu que sim. E Cadu contou que estava em um aniversário quando sem querer derrubou seu drink em uma garota. A garota gritou, o xingou, mas mesmo assim Cadu ficou encantado. Sentia que tinha algo diferente naquela mulher e resolveu investir. Durante toda festa, recebeu toco em cima de toco, até que já no finalzinho, ganhou um beijo e conseguiu o telefone dela. No início, ela dizia não querer compromisso, pois havia acabado de sair de uma relação. Mas com o tempo, ela parecia ter mudado de idéia.

Lucila ficou com pena de Cadu. Era óbvio que essa mulher não queria nada com ele. Tudo que ele contava não tinha recíproca, mas só ele não percebia. Isso, somando às várias tentativas de Cadu em telefonar para a namorada, todas sem sucesso, só reforçava que ele estava cego.

Lucila ficou preocupada em também não estar dando atenção aos sinais negativos de sua relação e por isso se comprometeu consigo mesma em colocar a história do anel e do dia do casamento de Ana, em pratos limpos.
Por isso, mesmo do caminho, ligou pra Rafa e combinou de encontrá-lo mais tarde em um restaurante. Rafa insistiu para que eles jantassem em casa, mas Lucila foi firme. Sabia que precisava de um território neutro, onde não cederia aos encantos do namorado.

A viagem acabou sem maiores problemas. Cadu deixou Lucila em casa e tentava insistentemente falar com sua namorada que não atendia a nenhuma de suas ligações. Mesmo sabendo que estava se intrometendo, Lucila arriscou:
- Que tal você fazer o mesmo com ela? Fica um tempo sumido, ela vai te dar valor.
Cadu não achou graça no conselho de Lucila. Foi ríspido em sua resposta:

- Cada um sabe cuidar da sua vida, não é mesmo?


Apesar do desfecho não muito agradável, os dois se despediram cordialmente e combinaram os próximos passos do projeto.

Lucila entrou em casa já pensando em que roupa colocaria. Seria imprudente usar algo provocativo, mas também seria burro não fazê-lo. Seja lá como fosse o andamento de sua conversa com Rafa, ela queria sair por cima. Queria ser valorizada por ele. Então, resolveu pelo meio termo. Um blusa preta de mangas compridas, não muito justa mas com um belo decote. A calça jeans daria a informalidade de que precisava e a sandália de salto, ajudaria a equilibrar sua auto-estima. Faltava pouco para a hora marcada, mas Lucila se arrumava lentamente. Desde que havia marcado o jantar, já tinha decidido que se atrasaria pelo menos vinte minutos. Isso fazia parte do seu plano.

Faltando dez minutos para a hora marcada, Lucila saiu sem pressa de casa. Quando entrou no carro, ainda pensou que talvez fosse mais prático pegar um táxi. Mas claro que isso era uma reação do seu inconsciente que esperava que Rafa tivesse boas justificativas pra tudo e que em um final feliz, os dois iriam juntos pra casa. Lucila não tinha garantias e precisava ter força para não se deixar levar mais uma vez.

Quando entrou no restaurante não viu Rafa. Olhou para um lado, para o outro e nem sinal dele. Não acreditava que ele pudesse se atrasar justo para aquele jantar que definiria o futuro de suas vidas.
A recepcionista veio em direção de Lucila que explicou que tinha uma reserva, mas aguardava o namorado. A moça apontou para o bar, onde Rafa distraído tomava um wisky, Alívio e tensão tomaram conta dela. Sem que ele percebesse, Lucila o olhava, percebia cada traço, cada gesto e se certificava de quanto ele era lindo. O modo de se sentar, de apoiar o copo no balcão. Quando Rafa olhou nervoso para o relógio, Lucila sentiu um calafrio. Aquele gesto era pra ela como uma prova de amor. Um sinal de que ele estava ansioso por sua chegada. Lucila quase se esqueceu do motivo porque estava ali.

Rafa olhou pra trás como se sentisse a presença de Lucila. Seu sorriso ao vê-la deixou até a recepcionista do restaurante atordoada. Era iluminado, sedutor, incrivelmente bonito. Lucila tremia. Como poderia confrontar um homem como ele? Como teria forças se mal conseguia resistir a um simples sorriso?

Ele levantou do banco alto, e foi em direção a namorada. Sua expressão era de felicidade. Felicidade genuína, ninguém poderia negar. Ele primeiro a abraçou forte e foi a beijando do pescoço até a boca. Discretamente, sem ser vulgar para o ambiente que estavam. Lucila estava dura como uma pedra. Não se mexia. Respirava rápido, quase na mesma velocidade que seu coração. Rafa se afastou e a olhou:
- É tão bom ver você!

Lucila sorriu e se virou para a recepcionista que assistia a tudo de boca aberta:
- Onde é nossa mesa?

A menina os levou até uma mesa de canto, com um sofá. Lucila não gostou. Precisava pelo menos de uma mesa que os separasse. Então pediu:
- Não tem uma sem sofá?

Sem acreditar que a cliente não quisesse se sentar no sofá com aquele deus grego, a menina disse:
- Sem sofá? Bom, temos essa.

- Está ótimo.


Os dois se sentaram. Rafa entendeu que a conversa não seria tão fácil. Na verdade, já sabia disso desde que Lucila mal atendeu suas ligações enquanto viajava. Mesmo assim, desta vez, não conseguiu planejar nada. Sua enorme facilidade de inventar histórias para as mulheres, havia o deixado na mão. Teria que improvisar e isso também o deixava nervoso. Nunca tinha passado por isso. Sentia culpa, que era um sentimento totalmente novo para ele.

Lucila se refugiou atrás do cardápio por alguns minutos. Não sabia como começar. Não tinha apetite, muito menos conseguia ler alguma coisa daquela lista de pratos. Rafa também olhava o menu, mas por de trás, observava Lucila. Arriscou sugerir um prato, que Lucila fez que não com a cabeça. Por fim, ela pediu uma salada e ele uma massa. Ela recusou o vinho indicado pelo namorado, pedindo uma água sem gás. Precisava ter total controle da situação. Ele pediu uma taça de vinho. Precisava relaxar.

Assim que as bebidas foram servidas, ambos tomaram enormes goles. Lucila pela primeira vez encarou Rafa e respirando fundo perguntou, tentando manter a voz calma:
- Preciso saber a verdade. Já sei que você não esteve no escritório no sábado. Então por favor, não me faça sentir ainda mais idiota do que eu já estou me sentindo.

Rafa se apavorou. Lucila nunca o tinha visto assim. Ele não sabia como começar e nem o que dizer. Bebia o vinho e comia torradas do couvert para ganhar tempo. Lucila continuou:
- E sobre o anel. Também preciso saber de quem é aquele anel e porque estava no seu banheiro.

Rafa sorriu amarelo tentando disfarçar. Diferente do seu comportamento habitual, desta vez não tinha o jogo de cintura que sempre o ajudava a sair de situações como esta. Estava pálido, tenso e Lucila podia jurar que estava trêmulo.
Alguns minutos se passaram em silêncio. Rafa se mexia na cadeira, se ajeitava, abria a boca, mas desistia. Lucila foi ficando com raiva. Sua vontade era sacudir Rafa até que ele falasse alguma coisa. Perdeu a calma, perdeu o juízo e gritou:
- Fala, Rafa! Eu não agüento mais. Fala o que aconteceu? Chega de me fazer de otária! Eu não vou ser passada pra trás de novo! Não vou!

O restaurante inteiro olhou pra eles. As mulheres, que antes olhavam sedutoras para Rafa, agora o olhavam com desprezo. Mesmo sem saber da história, qualquer mulher que assistisse aquela cena entenderia que se tratava de mais um caso de um lindo cafajeste magoando uma mulher apaixonada.
Rafa olhava pra baixo e nessa posição começou a falar:
- Eu não tive culpa. Desde que nos separamos da última vez, não tive nenhum relacionamento sério. Não conseguia. Me envolvia com mulheres por pouco tempo, sem promessas, sem compromisso. Me acostumei a isso. Eu tinha controle da situação, mas nesse dia, perdi o controle.

Lucila olhava atenta, ainda sem entender do que o namorado falava. Ele se enrolava, enxugava a testa molhada de suor e não conseguia olhar para ela.
- Antes de ficarmos juntos, terminei com um relacionamento. Como disse, não era nada sério. Mas ela não aceitou. E foi me procurar no dia do casamento. Ela chorava, gritava e eu não sabia o que fazer. Não podia deixar ela chorando, podia?

- Podia! – gritou Lucila.

- Bem, talvez você tenha razão. Mas não consegui e ela entrou.

- Entrou onde? Ela quem, Rafa!? É a mulher do anel?

Rafa continuou falando em tom baixo, olhando para o prato ainda vazio. Surpreso com a própria sinceridade, contou tudo a Lucila, incluindo o real motivo que o fizera se atrasar para o casamento de Ana. Quase chorando, se declarou totalmente arrependido e de fato naquele momento sentia arrependimento. Não acreditava que estava dizendo tudo aquilo para Lucila, mas não conseguia falar nada diferente da verdade. Temia perder Lucila. E agora, achava que a perdia a cada palavra sua. Mesmo assim, não se calava.

Lucila sentia raiva, nojo, horror em pensar que horas antes a tal Silvia estivera com seu namorado na mesma cama que pouco depois ele dormiu abraçado com ela. Em uma atitude totalmente auto-destrutiva, pedia detalhes para Rafa. Ele constrangido respondia quase monossilabicamente.

Os pratos foram servidos, mas nenhum dos dois tocou na comida. Lucila parou de falar Apenas duas coisas vinham a sua cabeça: porque ele está sendo sincero e o que eu faço agora?

Rafa tentou segurar sua mão, mas Lucila a puxou. Ele não sabia o que fazer. Nem parecia mais aquele homem sedutor que conseguia tudo com um sorriso. Parecia frágil e inseguro. Lucila não pode deixar de sentir um pouco do sabor em vê-lo daquela forma. A mesma forma que ela se sentiu tantas vezes no passado, quando descobria uma mentira de Rafa ou percebia seus olhares para outras mulheres. Agora ele estava totalmente na sua mão. E ela não sabia o que fazer com todo esse poder. Rafa falou:
- Sei que não posso pedir para que você me perdoe.

- Não pode mesmo.

Rafa abaixou a cabeça de novo. Lucila continuou em seu tom firme. Era quase prazerosa a sensação de ter o controle, o que a tornou um tanto sarcástica:
- Mas você pode pedir a conta. Estou sem apetite, vou pra casa.

Rafa obedeceu. Ficaram muito tempo sem dizer nada. Lucila altiva, orgulhosa, apreciando aquele momento. Rafa, encolhido em um sentimento estranho, ruim. Queria sumir, Tinha vergonha de estar ali.

Ele pagou a conta, os dois levantaram. Lucila saiu andando na frente e Rafa tentando alcançá-la. Antes de ela entrar no carro ele tomou coragem e perguntou:
- E nós?

Com um sorriso sarcástico, ela disse:
- Vamos pra minha casa. Preciso relaxar.

Um comentário:

  1. Como assim "vamos pra minha casa" !!!????
    Quer saber, ela merece o homem que tem ! hehehe

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