sexta-feira, 5 de junho de 2009

CAPÍTULO 41

Conforme havia combinado com Consuelo, logo na manhã seguinte, eles se encontraram com o advogado para discutir sobre as possibilidades de negociarem o depoimento de Consuelo em troca de seu visto permanente.

O advogado afirmava que se Consuelo pudesse identificar o provável assassino da Dra. Joana, isso seria um grande salto no caso e que era comum conseguirem esse tipo de negociação, visto que Consuelo vivia sozinha, sem família. Neste ponto da conversa, Consuelo interrompeu o advogado:
- O senhor me desculpe. Mas não vivo sozinha. Encontrei meu primo Ramirez que já tem o grenn card e vive com sua mulher aqui em Miami.

- Claro, claro. O que eu quero dizer, Dona Consuelo, é que a senhora só pede o visto para a senhora, não para sua família. Isso torna mais fácil, inclusive para senhora trazer seus filhos depois.

Consuelo se iluminou. Nunca havia pensado nessa possibilidade. Viver em Miami, a cidade dos sonhos, junto com seus filhos. Eles poderiam estudar, aprender inglês e se tornarem alguém na vida.

Juca sorriu, interpretando o olhar de Consuelo. Imaginava como deveria ser dura sua vida, longe de seus filhos, de suas raízes. Ele tinha sido bruscamente separado de sua família: Bruna. Sabia o quanto era triste, sofrido. Num ímpeto de solidariedade, Juca sugeriu:
- Vamos pedir a vinda dos filhos de Consuelo também. Ambos com o Green Card. Se não conseguirmos, baixamos a proposta para o visto apenas de Consuelo. Precisamos pedir alto primeiro. É base de qualquer negociação.

O advogado se assustou. Ainda argumentou que poderia ser uma jogada arriscada. Juca não deu bola. Repetiu que queria que a proposta para a Polícia de Miami incluísse a vinda dos filhos de Consuelo e afirmava que isso seria simples, se comprovassem o assassinato.

Consuelo sorria para Juca. Pensava em seus filhos. Pensava em como Dona Bruna tinha deixado aquele santo homem pra trás.

Na delegacia, o agente brasileiro organizava os depoimentos de Marcelo, que só falaria na presença de seu advogado, e de Bruna. Enquanto aguardava ser chamado, Marcelo ocuparia uma cela próxima a de Bruna.

Bruna lia quando ouviu uma grande movimentação no corredor. Andou até as grades e viu Marcelo sendo colocado em uma das celas. Seu ódio foi tanto que começou a gritar:
- Desgraçado! Filho da puta! Você ia me deixar aqui? Ia? Seu filho da mãe!

Ouvindo os gritos de Bruna, Marcelo parou antes de entrar no único ponto em que os dois podiam se ver. Ele se virou pra ela e disse com um ar totalmente debochado:
- Deus sabe o que faz! Eu não poderia ter um filho com uma mulher tão sem classe como você.

Dito isso, entrou em sua cela. Bruna não podia mais vê-lo, o que não a impediu de continuar o xingando. Se ela ainda tinha dúvidas sobre o caráter de Marcelo, ele tinha as tirado agora. Sabia que agora estava sozinha nessa.

Passado um tempo após seu acesso de raiva, Bruna não se sentia tão viva há tempos. Tinha sede de vingança. Queria acabar com Marcelo. Tudo na sua mente se tornou muito claro. Voltou ao passado e viu um filme de sua história com Marcelo.

Bruna vivia muito bem com Juca. Eram felizes. Ela havia deixado a JAHE, empresa de Juca, logo depois que se casaram e se dedicou a fazer o que realmente gostava. Fazia cursos, yoga, dança e ainda se preparava para começar um projeto social com patrocínio da empresa do marido.

Ela e Juca tinham uma vida social bem intensa. Muitos jantares ligados as relações de trabalho de Juca, viagens, congressos. No início Bruna adorava acompanhá-lo, mas com o passar do tempo o fazia apenas para agradar ao marido, que na sua opinião, merecia este sacrifício.

Algumas vezes se sentia entediada com sua vida e sempre que isso acontecia, pensava em voltar a trabalhar. Juca sempre desrecomendava e sugeria que ela começasse algum novo curso ou focasse no projeto social que ainda estava no papel. Assim, Bruna se matriculava em um novo curso e a mudança de rotina logo surtia efeito e ela se sentia melhor.

Numa vez em que acompanhava o marido em um congresso em Porto Alegre, Bruna teve mais contato com Marcelo Zacaro. Claro, eles já se conheciam desde de a época que Bruna trabalhava na JAEH, mas nunca tinham conversado. Bruna se surpreendeu com a simpatia de Marcelo, sua cultura e a educação que ele exibia. Era extremamente charmoso e isso era bem observado pelas esposas dos demais executivos.
Bruna achava ridículo ver todas aquelas mulheres se derretendo para ele. – Elas não tem vergonha na cara? – Marcelo se mostrava sem graça com essa situação e sempre que podia se refugiava em sua nova amiga: Bruna.

Com os constantes compromissos de Juca, nos quatro dias de congresso, Marcelo foi sua maior companhia. Sempre a procurava sugerindo irem conhecer algum lugar da cidade ou somente para jogarem conversa fora no lobby do hotel.

Juca parecia não se incomodar com a amizade dos dois, talvez por saber que Marcelo fosse namorado secreto de sua assistente Manú.
Manú sim, que ao saber da amizade dos dois ficou claramente incomodada. Bruna não sabia da relação dos dois, então atribuía isso à óbvia antipatia que Manú sempre teve com ela.

Depois de Porto Alegre, como por mágica, Marcelo e Bruna sempre se cruzavam sem querer. Era uma coincidência atrás da outra. Uma vez na saída da academia de Bruna, outra nas proximidades de seu curso de feng shui e até uma vez que Marcelo sem querer fechou o carro de Bruna, provocando a maior confusão na rua. Os dois riam sempre deste dia, relembrando como tinha sido divertida a tarde pós batida.

Bruna lembrava de tudo em detalhes. E agora desconfiava da veracidade de tantas coincidências. Tentava descobrir em que momento exato Juca deixou de ser tão importante dando lugar à Marcelo. Não sabia ao certo. Marcelo ia cada vez mais participando da sua vida e Juca cada vez menos, nem sempre por culpa dele, a própria Bruna já não dava tanta importância para a companhia de Juca.

Um dia quando já tinha certeza de seu casamento não era mais o mesmo, Bruna discutiu com Juca, como sempre por uma besteira. Saiu de casa à noite, sem destino. Quando parou em um bar, deu de cara com Marcelo que por mais uma incrível coincidência estava sentado no balcão. Os dois beberam a noite toda. Marcelo contava histórias divertidas e Bruna ria. Ela se sentia bem, livre. Em um momento da noite, Marcelo pegou na sua mão. Bruna sentiu um frio na barriga. Algo que não sentia há muitos anos. Ele a beijou. Naquele momento, Bruna como romântica irrecuperável que era, sabia que estava loucamente apaixonada por aquele homem.

Os dois começaram a ter um caso. Se encontravam as escondidas todos os dias. Primeiro em motéis na Barra, depois Bruna começou a ir ao apartamento de Marcelo. Foi numa destas idas que Bruna achou uma pasta com documentos que comprovavam o esquema da JAEH com o governo. Bruna questionou Marcelo sobre aquilo e ele, de uma forma que hoje Bruna não sabia como, conseguiu convencer Bruna de que ele tinha sido envolvido naquilo pelo seu pai. Waldemar Zacaro sempre fora ligado à política. Era um velho lobo, que por toda sua vida aparecia envolvido em alguns escândalos, mas logo depois sempre estava em um bom cargo novamente. Bruna acreditou que a influência do pai havia prejudicado o discernimento de Marcelo, que agora se dizia arrependido.

Bruna acreditou. E concordou em simular toda aquela história contra Juca para inocentar seu novo amor. Marcelo garantia que Juca não seria prejudicado e que ao acusá-lo, Bruna apenas arrumaria um motivo para o divórcio sem ter que revelar nada sobre Marcelo.

Lembrando de tudo, Bruna se sentiu uma completa idiota. Chorou. Chorou de raiva de si mesma, da sua burrice, da sua cegueira e do que deixou pra trás. Tinha vergonha do que tinha feito Juca passar. Pensava em Lucila e Ana. Como ela pode ter envolvido suas melhores amigas nisso? Olhou a data em seu relógio e concluiu que a essa altura Ana já estaria casada e em lua de mel. Como gostaria de ter ido ao casamento de Ana. Como gostaria de voltar no tempo.

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